(Dmitry Ratushny / Unsplash) |
Diversas coisa me deixam indignada quando penso que sou brasileira.
Me indigna o fato de que esta terra cheia de riquezas foi "fundada" com o sangue de negros escravizados e indígenas exterminados em prol da ganância do "nobre" europeu. Me indigna esse passado colonial que ainda se perpetua em diversos espaços da nossa sociedade e até mesmo em nossos padrões comportamentais - deixando passar o racismo nosso de cada dia velado sob a fantasia de que o Brasil é uma democracia racial.
Me indigna o fato de que pessoas foram eliminadas graças a um regime ditatorial cruel e parte delas nem sequer chegou a ser devolvida a seus entes queridos para uma despedida digna. Um regime voraz em relação a qualquer um que lhe fosse contrário - afinal de contas, o que era contrário não merecia sequer o direito à vida.
Me indigna como grande parte dos nossos políticos são eleitos com promessas de melhorias para os seus respectivos municípios, estados e até país e acabam desperdiçando todos os recursos públicos em prol de si mesmos.
Me indigna ver a pobreza escancarada nos grandes centros urbanos e nas regiões periféricas enquanto pouquíssimos esbanjam milhões em efemeridades.
Me indigna ter a frente da minha nação um presidente movido pelo ódio que desrespeita todos aqueles que lhes são contrários e não age como chefe da nação, mas como um verdadeiro déspota - só ele tem a razão. Quem diz o contrário é petista ou, pior ainda, comunista (uma alcunha no mínimo engraçada para se referir a um sistema que, na verdade, nunca chegou a ser verdadeiramente estabelecido em nenhum país do mundo).
Mas hoje me sinto ainda mais indignada por ver o movimento que esse mesmo homem tem feito para deslegitimar tudo o que parece trazer um pouco de luz às nossas vidas. Os jornalistas viraram seus inimigos, já que "atacam" constantemente o capitão que mal consegue governar a própria língua. Movido pelo ódio a tudo aquilo que lhe contradiz, o presidente passou a atacar também a ciência quando preferiu a retórica do vizinho norte-americano do que as indicações de seus antigos ministros da Saúde - ambos médicos, diga-se de passagem.
Quase um ano desde que a pandemia se instalou em todo o planeta, o Brasil já ultrapassa o triste número de 210 mil mortos. Em meio a tanta tristeza, surge, porém, a esperança alardeada com a chegada da vacina. Mas como reverter todo um discurso negacionista que se infiltrou no subconsciente de tantos brasileiros que foram levados a desacreditar na ciência e crerem apenas no que é dito pelo "mito"?
Ainda assim, de acordo com a pesquisa do Ipsos Global Advisor, feita em associação com o Fórum Econômico Mundial, ainda somos a segunda nação mais propensa a se vacinar contra o novo coronavírus (de acordo com os dados de dezembro, 78% dos brasileiros desejam se vacinar contra a Covid-19).
Oxalá que essa disposição para a vacinação se concretize e, mais que isso, que não falte vacina gratuita para nenhum brasileiro.
E, se é possível ter esperança, que esse nosso passado sombrio, marcado por diversos tipos de violência torne-se cada vez mais distante e que sejamos capazes de nos recriar como sociedade mais justa, mais honesta, mais igualitária e respeitosa, sem negligenciar as nossas necessidades e diferenças, e sem nunca duvidar de algo tão elementar e necessário como a ciência.
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